07 janeiro, 2009

As galerias acabam por ficar desertas e escolhem-se espaços alternativos, longe das grandes cidades e do alvoroço da civilização moderna. Na land art resurge o desejo de se operar para a lém dos limites tradicionais, desejo que, no século XIX, tinha levado por exemplo, Gauguin para o Taiti e Rimbaud para África. Redescobre-se também o mito do herói romântico, na figura do artista que parte em busca de algo indefinido, indiferente às distâncias, aos incómodos e aos eventuais perigos. Para alguns, a viagem assume mesmo o valor de um percurso iniciático ou catártico, que pode culminar na expressão de si mesmo, mas encobre o risco da perda de identidade. O que importa não é instalar na natureza virgem obras previamente executadas nos ateliers, mas executá-las no local, moldando-o até o transformar em obra de arte.

06 janeiro, 2009


O narcisismo dos artistas parece então carregar-se de uma espécie de exaltação masoquista, que os leva por  vezes a ferirem-se a si próprios. Para provocarem o público, há alguns que chegam mesmo a retalhar a sua própria pele, como Gina Pane, a enrolar serpentes à volta do pescoço e do rosto, como Marina Abramovic, ou a contorcer-se em espasmos de dor como Gunter Brus. Outros, como os gays Gilbert & George, prolongam a sus identificação com a obra de arte para lá  do tempo de exibição: pretendendo viver como uma obra de arte todos os momentos dos seus dias, transformam cada gesto em acontecimento. Em muitos casos, a transgressão é particularmente ousada. Os serões futuristas parecem, em comparação récitas de escola. A polícia  intervém frequentemente para interromper performances consideradas ultrajantes, e vários artistas são julgados em processos judiciais. Na ânsia de omnipotência que parece animar alguns, o limite entre operação artística e obscenidade é bastante frágil, e Otto Muehl acaba por passar anos na cadeia devido aos excessos praticados no seio da comunidade que fundou. 
Neste contexto, a relação com o mercado da arte também muda. Como não é possível à venda o próprio corpo do artista, as galerias tem de se contentar com as fotografias ou os filmes das performances realizadas. Por seu lado, o público não só é obrigado a assistir a cenas desagradáveis ou repugnantes, como também se sente frustrado no seu desejo-aliás, legítimo-de comprar objectos de arte, tendo eventualmente de se contentar com documentos comparáveis ao material que existe nos arquivos e nas bibliotecas.

05 janeiro, 2009







O artista actor, desde o início do século xx que os artístas das vanguardas históricas tinham renunciado às telas para optarem por diversos instrumentos. Na época da arte informal, embora o quadro subsista, a posição do pintor muda: o artista conta-se na tela e confronta-se com ela com uma força, mental e física, totalmente nova. Até então, o corpo não passara de um mero instrumento, um intermediário que substituía o pincel, mas nunca tinha sido arte. Marcel Duchamp, que antecipou quase tudo o que se fez ao longo do século, exibiu o seu próprio corpo num jogo de disfarces imortalizado pela máquina fotográfica de Man Ray, mas tudo não passou de espécie de divertissement.


Pelo contrário, com a body art, o corpo do artista ocupa o primeiro plano, na medida em que é considerado como sendo o elemento mais capaz de exprimir uma ideia e estabelecer uma relação com o público. Portanto, o artista expõe-se, e o que se vê nas galerias já não são as suas obras, mas ele próprio, como obra de arte viva, móvel. Deixa de haver qualquer distinção entre sujeito e objecto, tudo se funde num único corpo, com atitudes diferentes.

30 dezembro, 2008



Por conseguinte, o artista do novo realismo é um misto de poeta e de ferro-velho: capaz de captar uma espécie de segunda vida, ou uma vida diferente, nas coisas usadas, está decidido a exibir a sua pobreza aparente, enriquecida, porém, pela espessura do tempo que essas coisas atravessaram. O seu teórico, Pierre Restany, representa um novo género de crítico, que irá impor-se na segunda metade do século xx, um crítico que já não é um juíz sentencioso que dita os seus veredictos, mas uma espécie de companheiro com quem se pode partilhar e discutir experiências artísticas e humanas.

22 dezembro, 2008

Por outro lado há os seguidores do novo realismo que se inspiram igualmente no mundo dos bens de consumo, e chegam mesmo a introduzi-los nas suas obras, convertidas em amostras de realidade, mas os objectos que escolhemnão são os que se encontram ordenadamente dispostos nas parteleiras dos supermercados, são os seus restos, depois de terem sido alterados pelo homem. Pondo de lado os pincéis e as telas, vasculham os sótãos , nos caixotes de lixo e nos cinzeiros repletos de pontas de cigarros, nos parques de sucata, nas proximidades das salas de cinema, onde podem descolar cartazes já rasgados por mãos humanas ou intempéries.


16 dezembro, 2008

Portanto, por um lado temos Andy Warhol, que adora todas as imagens, tanto as que o rodeiam como as que ele próprio reflecte. Warhol é um artista mundano, que participa em festas sociais e organiza parties no interior da sua Factory, o atelier frequentado pelas personagens mais famosas de todos os domínios criativos, desde os escritores da beat generation, Kerouac e Ginsberg, até aos grupos musicais Rolling Stones e Velvet Underground, e aos amigos anónimos e ambíguos que participam nos seus filmes. Como qualquer outra actividade comercial, a arte é entendida como instrumento de produção e de lucro, e os tromentos intímos do artista são substitídos por considerações mais mercantis. Aliás Warhol, que afirmava que ser-se americano consistia mais em comprar do que em pensar, dedica uma série de obras ao dolar, pretendendo assim demonstrar até que ponto o dinheiro se tornou omnipresente.

14 dezembro, 2008

Nos anos sessenta, começam a esboçar-se duas formas de analisar a sociedade ocidental contemporanea, caracterizada pela difusão dos bens de consumo mais variados e pela omnipresença da propaganda publicitária. Por um lado há o artista pop americano, simbolizado por Andy Warhol, perfeitamente integrado no meio que o rodeia, satisfeito, pelos menos aparentemente, com a suprefície resplandecente dos objectos que representam esse meio. Por outro lado, temos o partidário do novo realismo, mais ponderado, mais atraído pela outra face da sociedade de consumo, que não se interessa pelos objectos destinados a serem vendidos, mas pelos objectos de refugo, pelo lixo.

08 dezembro, 2008



É com o mesmo desencanto que warhol olha para um objecto ou para uma personagem famosa, "consumida" através da imprensa ou da televisão como um produto comestível. Um aspecto mais lúdico caracteriza as obras de Roy Lichenstien (1923-1997), que reproduz, ampliando-os, excertos de banda desenhada: os heróis e as heroínas, assim retirados do contexto original, surgem como figuras muito mais improváveis. Como improváveis acabam por ser os objectos supradimensionados de Claes Oldenburg: um interruptor construído em material mole, uma colher de pedreiro monumental , hamburguers, tortas e alimentos em matéria plástica e de cores berrantes.

02 dezembro, 2008


Assim, Andy Warhol (1928-1987) repete a imagem de um produto sempre presente na despensa de qualquer família americana média, a lata de sopa campbell, ou alinha caixas de detergente Brillo, como se estivessem na montra de uma loja, com um olhar aparentemente imóvel, ou seja sem revelar qualquer ironia, como faria, pelo contrário, Duchamp, mas reflectindo apenas os gostos e os hábitos alimentares predominantes na sociedade americana do seu tempo.
No início dos anos sessenta, o furor dos expressionistas abstractos, que dominara a cena do decénio anterior, extingue-se de repente. Em vez das grandes telas cobertas raivosamente de tinta, surgem imagens retiradas do mundo popular, desde a banda desenhada até aos géneros alimentícios vendidos nos supermercados. Passa-se, portanto, da exibição da complexa interioridade do artista para a reprodução do quotidiano óbvio, não reinterpretado, não filtrado, apenas confirmado na repetição mais ou menos fiel.