20 novembro, 2010




O EXCESSO E O ACTIVISMO ARTÍSTICO CONTEMPORÂNEO

Hoje em dia, na nossa economia global,
a suposição de um exterior puro é quase impossível.
Hal Foster
Há uma inquietação expressa por Gilles Deleuze no Prólogo de Diferença e Repetição
que paradoxalmente me persegue e ilumina desde a primeira vez que a li. Diz ele: “Ao
escrevermos, como evitar que escrevamos sobre aquilo que não sabemos ou que
sabemos mal? É necessariamente neste ponto que imaginamos ter algo a dizer. Só
escrevemos na extremidade do nosso próprio saber, nesta ponta extrema que separa o
nosso saber e a nossa ignorância e que faz passar um ao outro. É apenas deste modo
que somos determinados a escrever. Suprir a ignorância é transferir a escrita para
depois ou, antes, torná-la impossível. Talvez tenhamos aí, entre a escrita e a
ignorância, uma relação ainda mais ameaçadora que a relação geralmente apontada entre
a escrita e a morte, entre a escrita e o silêncio”1.
Escrever, na verdade, talvez não passe desse exercício imperfeito que tem por
objectivo contrariar a nossa própria ignorância. Acumulamos, por isso, um magma de
ideias, em palavras e frases de sentido mais ou menos vivo e duradouro, com o qual
redesenhamos constantemente uma leitura do mundo e da vida. Nessa medida, ter algo
a dizer sobre um assunto ou tema tão premente como o excesso contemporâneo é uma
tarefa que comporta uma certa dose de ignorância, pois desconhecemos sempre a
amplitude de um fenómeno que não sendo novo está longe de estar confinado a uma
etapa definida e caracterizada, actuando ainda todos os dias de um modo que
poderíamos dizer exponencial. Por outro lado, reflectir sobre esse mesmo excesso
conduz-nos a uma leitura de sentido crítico perante a evidência de correlação com o
próprio esgotamento do humanismo, entrado em crise desde o segundo pós-guerra,
quando a reavaliação sobre a centralidade do sujeito guiou a teoria crítica a conceitos
tão actuantes como a identificação estruturalista de Michel Foucault2 sobre os
“epistemas” e as suas relações com o controlo e o exercício do poder, ou a assombrosa
“morte do homem”, entendida enquanto falência do projecto humanista desenvolvido
desde o Renascimento; a determinação sobre a importância dos “paradigmas
legitimadores” de cada época (Thomas Khun)3; ou ainda a “morte do autor” e a
valorização maior do leitor no processo de interpretação e significação do texto
(Roland Barthes)4. Mais tarde, Jean-François Lyotard5 desenvolveria a sua teoria
sobre a “condição pós-moderna”, introduzindo um conceito que não só identificava a
falência das “grandes narrativas históricas”, como viria a ter grandes repercussões ao
nível da reflexão sobre a produção artística contemporânea.

1
Gilles Deleuze, Diferença e Repetição (1968), (Trad. brasileira de Luiz Orlandi e Roberto Machado –
revista para Portugal por Manuel Dias), Prefácio de José Gil, Lisboa, Relógio D’Água Editores, 2000,
p. 38.
2
Michel Foucault, As Palavras e as Coisas (1966), (Trad. de António Ramos Rosa), Lisboa, Edições
70, 1991.
3
Thomas S. Kuhn, La Structure des Révolutions Scientifiques (1962), Paris, Flammarion, 1983.
4
Roland Barthes, “La morte de l’auteur” in Oeuvres Complètes, Tomo II (1966-1973), Paris, Éditions
du Seuil, 1994, pp. 491-495.
5
Jean François-Lyotard, A Condição Pós-Moderna, (Trad. de José Bragança de Miranda), Lisboa,
Gradiva, 1989 (2ª ed.).
De outro modo, a desestabilização gerada por estes e outros conceitos finisseculares
em torno da noção do homem e a consequente relativização de alguns dos valores que
se julgavam mais enraizados e determinantes na sua construção, contribuíram para a
aceleração de uma espécie de equivalência valorativa que abriu espaço a um pluralismo
e relativismo acríticos, responsáveis sobretudo pela dominação do arbitrário. Porém, o
reverso desta situação é que a contemporânea proliferação de tudo, literalmente tudo,
não traduz mais, afinal, do que um certo resultado ou repercussão da nossa própria
cultura secular, nomeadamente a exponenciação progressiva dos seus valores de
racionalidade, democracia, igualdade e liberdade. Apesar de todas as perspectivas
críticas produzidas ao longo do século XX, este sistema valorativo manteve e mantém
ainda uma presença e uma operacionalidade inquestionáveis.
A consciência de que pertencemos a um mundo em caleidoscópio, simultaneamente
especular e espectacular, produz ao mesmo tempo uma estranha ambição de contrariar,
tanto quanto possível, essa toxicidade que lentamente nos asfixia. O excesso pode
assim ser entendido como a manifestação maior e mais perversa dessa incessante
circulação de uma pluralidade paradigmática e hoje plenamente generalizada,
responsável pela abolição de qualquer tipo de dominação efectiva, para além do
próprio exercício do capitalismo. Confundidos sobre a expressão de um poder cada
vez mais dissimulado ou mesmo invisível, que voluntariamente concede uma espécie
de micro-legitimidade sobrevivente a todas as vozes ou orientações alternativas –
inclusive a alteridade radical de culturas-outras inspirada na acção etnográfica ou
antropológica6 – vemo-nos assim enredados nessa imbricada teia de relações de
visibilidade e projecções parciais. O sistema informacional (informe) que caracteriza a
nossa contemporaneidade realiza afinal o sonho ou o pesadelo de uma imensa mas
desestruturada Torre de Babel. Todos sabemos, consciente ou inconscientemente, do
modo esmagador como somos bombardeados por imagens, opiniões, realizações,
protestos, dissenções ou qualquer outra eventual expressão viva da humanidade. Tudo
acontece como um grande “happening” mediatizado até à exaustão pelos diversos e
poderosíssimos meios de comunicação de massas, sem os quais “nada acontece” mas
com os quais também tudo se anula na proliferação desenfreada de um sistema
uniformizador de alienação quase total. Nessa medida, onde a exposição radical de tudo
e de todos se tornou definitivamente omnipresente, o excesso é a expressão mais
adequada para caracterizar o estado actual de uma sociedade ocidental que rapidamente
se globalizou à escala do planeta.
Identificando alguns destes sintomas, Gilles Lipovetsky falava há alguns anos atrás de
uma nova “era do vazio”, de uma “sociedade hedonista” marcada por um lento
“crepúsculo do dever”7 que progressivamente silenciara os valores humanistas, e
contra os quais uma inevitável invasão se desenhava, apontando para um domínio cada
vez mais heteróclito de paroxismo individualista, consumista e alienante. Contra esse
estado de coisas, ao mesmo tempo que a cultura do excesso se legitimava entre as
sociedades ocidentalizadas, alguns artistas iniciavam uma aproximação crítica aos
valores de uma arte empenhada politicamente, de reflexão não panfletária sobre os

6
Sobre a relação da arte contemporânea com o valor da alteridade radical cf. Hal Foster, The Return of
the Real. Mass./London, The MIT Press, 1996, pp. 171-203.
7
Cf. Gilles Lipovetsky, A Era do Vazio – Ensaio sobre o individualismo contemporâneo, (trad. port.
Miguel Serras Pereira e Ana Luísa Faria), Lisboa, Relógio D’Água, 1989.
problemas sociais, que apelava a uma profunda reinterpretação da ideia do “outro”,
fosse na sua dimensão cultural, política ou social, com vista a fundar uma mais
consciente e consequente ideia de pluralidade. Em certa medida, a arte da segunda
metade de Novecentos aproximara-se do desígnio pós-estruturalista de perscrutar um
espaço ainda ideal de alteridade exterior, buscando um “outro” capaz de derrubar o
logocentrismo ocidental. Esta onda crítica apontava o dedo à “fantasia primitivista”
que ajudara a construir e desenvolver as “ciências sociais” e o “modernismo artístico”
desde o século XIX em torno da ideia do “outro” como expressão do “diferente”, do
“impensado”. Michel Foucault diria a propósito que “o impensado (qualquer que seja
o nome que se lhe dê) não está alojado no homem como uma natureza mumificada ou
uma história que nele se houvesse estratificado, mas é, em relação ao homem, o Outro:
o Outro fraterno e gémeo, nascido não dele, nem nele, mas ao lado e ao mesmo tempo
numa idêntica novidade, numa dualidade irreversível”8. Hal Foster lembra que o
mesmo Foucault, em The Order of Things (1966), alerta para os perigos do “nosso
sono antropológico”9, argumentando que o sujeito moderno, “este homem do século
XIX, difere do sujeito clássico das filosofias cartesiana e kantiana porque procura a
sua verdade no ‘impensado’ – o inconsciente e o outro (esta é a base filosófica do
cruzamento primitivista de ambos). ‘Um desvelamento do não-consciente’ escreve
Foucault, ‘é a verdade de todas as ciências do homem’, e é por isso que tais
desvelamentos como a psicanálise e a antropologia são os mais privilegiados de todos
os discursos modernos. A esta luz [acrescenta Foster] o ‘outrar’ do eu, passado e
presente, não é mais que um desafio parcial para o sujeito moderno, pois esse outrar
também reforça o eu através da oposição romântica, conserva o eu mediante a
apropriação dialéctica, expande o eu mediante a exploração surrealista, prolonga o eu
através da perturbação pós-estruturalista, etc. Da mesma forma que a elaboração da
psicanálise e da antropologia foi fundamental para os discursos modernos (a arte
modernista incluída), assim se apresenta também crucial a crítica destas ciências
humanas para os discursos pós-modernos (arte pós-modernista incluída)”10.
Atento a esse “outrar”, herdeiro da “nossa prática milenar do Mesmo e do Outro”11,
desenvolver-se-ia, com efeito, um novo sentido de activismo artístico pós-moderno
que viria a ser identificado com a acção do “artista como etnógrafo”. No seu estudo
The Return of the Real (1996), Hal Foster apresenta “a viragem etnográfica na arte
contemporânea”12 como a sua marca essencial e finissecular, defendendo que “neste
novo paradigma o objecto de contestação continua a ser ainda a instituição burguesa-
capitalista da arte (o museu, a academia, o mercado, os media), as suas definições
exclusivas de arte e de artista, identidade e comunidade. Porém, o tema de associação
mudou: é o ‘outro’ cultural e/ou étnico em nome do qual o artista engagé luta a maior
parte das vezes. Por subtil que pareça, esta deslocação de um tema definido em termos
de relação económica para um outro definido em termos de identidade cultural é

8
Michel Foucault, As palavras e as coisas: Uma arqueologia das ciências humanas, Lisboa, Edições
70, 1991, p. 365.
9
Michel Foucault, The Order of Things, New York, Vintage Books, 1970, pp. 340-343. [informação
colhida em Hal Foster, op. cit., p. 180].
10
Hal Foster, op. cit., p. 179.
11
Michel Foucault, As palavras e as coisas: Uma arqueologia das ciências humanas, Lisboa, Edições
70, 1991, p. 47.
12
Hal Foster, op. cit., p. 184.
significativo”13. Foster situa aqui, não sem reservas, uma espécie de transição entre o
“artista enquanto produtor”, como na tese de Walter Benjamin dos anos 3014 – onde
defendia o sentido utópico e modernista de uma arte politicamente empenhada que
fizesse desaparecer ou pelo menos diminuir a arte e a cultura burguesas, no exemplo do
construtivismo russo – e o “artista como etnógrafo” das últimas décadas. Com efeito,
após a acção (por vezes situacionista) de alguns grupos de artistas dos anos 70 e 80
que actuaram – inspirados ainda, de certo modo, no desígnio do “artista como
produtor” – em nome de reivindicações político-sociais, como é o caso dos colectivos
Guerrilla Girls (o feminismo) do ACT-UP (sobre a SIDA), ou de artistas que
preferiram uma acção individual como Barbara Kruger (contra a alienação do sentido
no tardo-capitalismo) ou Krzysztof Wodiczko (na atenção aos homeless, ou contra o
apartheid, o racismo ou a xenofobia das metrópoles), um outro género de artistas
parece tomar o lugar do artista utópico que caracterizou a arte moderna do século XX.
Trata-se do “artista como etnógrafo”, no exemplo de Renée Green, Eugenio Dittborn,
Lothar Baumgarten, Jimmie Durham, Mark Dion ou Rirkrit Tiravanija, entre muitos
outros, que, certamente menos crentes no carácter idealista, no alcance universal da sua
acção ou no enfoque transformador sobre as relações económico-classistas do social,
estarão mais conscientes das potencialidades residuais e locais do seu propósito
criativo – ainda engagé, mas já não panfletário – que passa a ter na antropologia e na
ideia do “outro” como valor da alteridade a sua base essencial de compreensão
alternativa, desenvolvendo uma espécie de resgate simultaneamente “arqueológico” e
“actual” das historicidades locais fragmentadas ou em vias de extinção. Mas não se
trata aqui, todavia, da visão idealista em torno do “outro” que os modernistas
promoveram, como na “fantasia primitivista” cara a cubistas e expressionistas ou na
unidade textual das collages dos surrealistas que tomaram do inconsciente esse desejo
especular do “outro”. No fundo, toda a convocação do “outro” que o modernismo
realizara tinha como sustentação essencial o idealismo de uma unidade universal, não já
para “educar” ou “converter” o “outro” mas para se auto-anular precisamente no
“outro”, salvando-o da modernização ocidental, assumindo aí a expressão de um
“novo” ideal. Ora, é na anulação do valor idealista do “eu” ou do “outro” que o “artista
como etnógrafo” se distingue não só do “autor [artista] como produtor” como do
modernista que interpretara com entusiasmo o primitivismo tornado redentor. Isto é,
se o “artista enquanto produtor” traduzia uma vontade de intervenção social a partir
de uma experiência criativa traduzida no auxílio ao “outro”, entendendo este como
explorado pela sua condição económica e social desfavorável, e utilizando sempre em
favor dessas questões os mecanismos de promoção e difusão mediática próprios das
artes visuais contemporâneas e de todo o seu milieu essencialmente burguês, já o
“artista como etnógrafo” parece promover, pelo menos aparentemente, no interior do
meio artístico burguês-capitalista, uma possibilidade de alteridade, em respeito pela
idiossincrasia cultural do “outro”. Desse modo, a diferença do “outro” poderá
significar uma derradeira oportunidade de combate e alteridade transformadora contra a
omnipresença imagética do tardo-capitalismo, o que é ainda uma outra forma de dar
continuidade, pelo menos em parte, à tese de Walter Benjamin acerca do “derrube” da

13
Idem, p. 173.
14
Walter Benjamin, Reflexions, ed. Peter Demetz, trad. ingl. Edmund Jephcott, New York, Harcourt
Brece Jovanovich, 1978, pp. 220-238. [informação colhida em Hal Foster, op. cit., p. 171.]
arte burguesa pela “arte produtivista”15, aliviando contudo o carácter revolucionário e
de conversão que o produtivismo construtivista defendera. Na verdade, a viragem
etnográfica na arte contemporânea verifica-se quando a prática artística passou a
considerar “o campo expandido da cultura, de que a antropologia é suposta ocupar-
se”16. Acompanhando esta viragem, defende Hal Foster, está “uma série de
deslocamentos no local da arte: da superfície do medium ao espaço do museu, da
estrutura institucional às redes discursivas, até ao ponto em que muitos artistas e
críticos tratam estados como o desejo ou a doença, a SIDA ou os sem-abrigo, como
sítios para a arte. Juntamente com esta figura do situar surgiu a analogia do
mapeamento. Num momento importante, Robert Smithson e outros conduziram esta
operação cartográfica até um extremo geológico que transformou drasticamente o situar
da arte. Todavia, este situar também tinha os seus limites: podia ser recuperado pela
galeria e museu, brincava ao mito do artista redentor (um sítio deveras tradicional),
etc… Por outro lado, o mapeamento na arte contemporânea enveredou pelo caminho
da antropologia e da sociologia, até ao ponto em que um mapeamento etnográfico de
uma instituição ou comunidade é hoje uma forma primordial da arte de sítio-
específico”17. Acontece que esta “viragem linguística” ou “discursiva” promovida pelo
processo quase “científico” de investigação da arte activista não é, nem nunca foi, puro
ou inocente, como por vezes se pretendeu. Na verdade, são muitas vezes as próprias
instituições responsáveis pela legitimação artística a encomendar estes “mapeamentos
etnográficos”, pervertendo assim os seus objectivos iniciais de desconstrução do
sentido, comprometendo ou anulando mesmo, dessa forma, qualquer hipótese crítica
mais consequente. A perversidade do processo está, naturalmente, ligada às próprias
necessidades das instituições que, sob o paradigma estabelecido da tolerância e de não
deixar escapar a novidade alternativa, acabam por absorver (importando) quase de
imediato toda e qualquer incursão crítica sobre o seu próprio campo de acção.
Nesta medida, e apesar das intenções neo-redentoras desta nova experiência “estética
relacional”18 – como na definição de Nicolas Bourriaud – Hal Foster acaba por refrear
o alcance de boa parte das acções “politicamente empenhadas” e “desconstrutivistas”
destes “novos” “artistas etnógrafos”, acentuando a ambiguidade de alguns projectos de
alteridade pelo facto de manterem activa, pelo menos em parte, a matriz essencial da
“fantasia primitivista”19 que atraiçoara as “boas intenções”, também elas redutoras, da
arte modernista. Neste sentido, Foster adverte que “na medida em que a arte
primitivista não está desarticulada, na medida em que o outro permanece confundido
com o inconsciente, as explorações da alteridade até aos dias de hoje ‘outraram’ o eu à
maneira antiga em que o outro continua a ser o pano de fundo do eu (por mais que este
eu seja perturbado no processo), mais que ‘individualizarem’ o outro de uma maneira
nova na qual a diferença é permitida e até apreciada (talvez através do reconhecimento
da alteridade do eu). Também neste sentido, a fantasia primitivista pode continuar viva

15
Defendendo sobretudo o “produtivismo” face ao “Proletkult” (dois movimentos rivais no início da
União Soviética), Walter Benjamin acusa este último de ser a expressão de um mecenato ideológico
que posicionava o operário como um outro passivo. Ainda segundo Benjamin, a solidariedade
praticada pelos “produtivistas” baseava-se na prática material e não apenas no tema artístico ou na
atitude política típica do “Proletkult”. Sobre esta questão cf. Hal Foster, op. cit., pp. 173-180.
16
Idem, p. 184.
17
Idem, pp. 184-185.
18
Cf. Nicholas Bourriaud, Esthétique relationnelle, le presses du réel, 2001.
19
Hal Foster, op. cit., p. 175.
na arte quase-antropológica”20; por consequência, “o papel quase-antropológico
atribuído ao artista pode promover uma presunção tanto quanto um questionamento
da autoridade etnográfica; uma evasão como também uma extensão da crítica
institucional”21. Foster defende igualmente que a alteridade pretendida pelos novos
“artistas etnógrafos” é demasiado dependente ainda de uma espécie de dialogismo de
cariz hegeliano, herdado em parte do conceito situacionista de “détournement”. O
“détournement” debordiano consistia na utilização ainda utopista, porque
revolucionária, de uma certa ideia de “site-especific”, aludindo a uma nova unidade
criativa e significante estabelecida em torno de elementos artísticos pré-existentes e
díspares entre si, que deveriam mesmo assim confundir uma pretensa origem e unidade
universais. Assegurando uma associação ilógica e inesperada, o “détournement”
procurava inviabilizar o significado original ao promover novas leituras e sentidos
sobre as imagens ou as palavras tomadas como objecto do discurso, diferenciando-se
assim da estratégia da “collage” e da “assemblage” Dada ou surrealista pela sua
manipulação mais abrangente, aplicável a qualquer situação, podendo e devendo ser
usado por um crescente número de indivíduos, incluindo não artistas. Ou seja, a
estratégia estética do “choque”, enquanto elemento de composição visual associado à
transitoriedade frenética da vida moderna, apresentava no Situacionismo uma nova
exigência da acção política, construindo situações de afirmação consciente em torno de
um urbanismo total, diminuindo os efeitos do espectáculo visual da grande cidade, e
por isso trabalhando no domínio mais evasivo mas persistente da palavra tornada
slogan ou derradeira utopia ao assumir o comprometimento com uma arte pública de
carácter político e activista, aproximando assim a arte ao quotidiano – entendendo este
não como manifestação de uma vida feita de rotinas orientadas pelo espectáculo
capitalista, mas antes enquanto expressão individual das mais profundas inquietações
acerca dos problemas colectivos. O problema do activismo artístico contemporâneo
radica na mesma dificuldade identificada pelos situacionistas dos anos 50 e 60, pois às
intenções políticas apresentadas como críticas do domínio burguês e capitalista da
sociedade ocidental, os situacionistas, tal como os actuais “artistas etnógrafos”,
acrescentam ainda, apesar das metáforas sobre o local ou o “sítio-específico”,
nomeadamente em torno do mapeamento do sítio da acção, uma certa dose dessa
“fantasia primitivista” marcada por uma pureza de intenções que não deixa de persistir
numa outra forma de apropriação sobre o “outro”, ainda que este modo de apropriação
esteja nos antípodas das relações de dominação identificadas na estratégia alienante do
espectáculo capitalista. Hal Foster afirma a este propósito que também hoje, tal como
na estratégia situacionista, “projectos impressionantes de sítio-específico foram
transformados em sítios turísticos, e a disrupção situacionista reconciliou-se com a
promoção político-cultural”22. Uma vez mais, o sistema capitalista tudo absorveu em
seu favor. Aliás, numa pequena nota do capítulo “O Artista como Etnógrafo”, Foster é
muito claro quando identifica a perda de protagonismo crítico do artista ao longo da
segunda metade do século XX em favor do “todo-poderoso” comissário que
desenvolve em termos teóricos os eixos principais que conduzem, pelo menos em
parte, a própria acção artística dita engagé: “se os anos setenta foram a década do

20
Idem, p. 178.
21
Idem, p. 197.
22
Idem, p. 198
teórico e os anos oitenta a década do negociante de arte, os anos noventa pode
considerar-se a década do comissário itinerante que reúne artistas nómadas em sítios
diferentes. Com a queda do mercado de arte em 1987 e as controvérsias políticas que
se lhe seguiram (Robert Mapplethorpe, a arte ‘obscena’, Andres Serrano…), nos
Estados Unidos o apoio à arte contemporânea entrou num período de declínio. O
financiamento foi reorientado para instituições regionais, que no entanto importaram
em grande parte artistas metropolitanos, acontecendo o mesmo com as instituições
europeias onde o financiamento permaneceu relativamente alto. Foi assim que nasceu o
artista etnógrafo migrante”23.
Na verdade, o actual projecto cartográfico e localista, promotor do mapeamento ou de
uma certa ideia “etnográfica” do “outro”, para além de abandonar de uma vez por
todas o “medium-específico” em favor do “discurso-específico” – numa estratégia que
confirma aliás a tese central de Leo Steinberg em Other Criteria (1968) que identificava
já nas “combine-paintings” de Robert Rauschenberg a passagem “pós-medium” (que
Hal Foster e depois Rosalind Krauss voltariam a interpretar como marca
epistemológica da arte contemporânea mais decisiva) “de um modelo vertical de
pintura-como-janela para um modelo horizontal de pintura-como-texto, de um
paradigma ‘natural’ da imagem como paisagem emoldurada, para um paradigma
‘cultural’ da imagem como rede informacional”24 – realiza também um alcance bastante
residual, ainda que aceite e até premeditado pelos próprios artistas, quanto aos seus
resultados de uma consciencialização parcelar. Daí que, em alguns casos, os artistas
que assim procedem estejam conscientes da complexidade da sua proposta e até auto-
críticos acerca do seu valor real, parodiando por vezes para melhor desestabilizar o que
é suposto estar mais definido e alicerçado. Foster defende, por exemplo, o carácter
consciente e por isso mais actuante do modelo ou “pseudo-modelo” etnográfico
apresentado por Jimmie Durham. “Nas suas obras híbridas, Durham combina objectos
ritualistas e objets trouvés, de uma forma que é preventivamente auto-primitivista e
ironicamente anti-categórica. Estes fetiches pseudo-primitivos e os artefactos pseudo-
etnográficos resistem a mais primitivização e antropologização através da ‘impostura’
paródica destes mesmos processos. Todas estas estratégias – a paródia de
primitivismos, a inversão dos papéis etnográficos, o fingimento preventivo da morte,
uma pluralidade de práticas – perturbam uma cultura dominante que depende de
estereótipos estritos, de linhas estáveis de autoridade, e de todo o tipo de reanimações
humanistas e ressurreições museológicas”25.
De um modo geral, podemos registar que esta transformação da arte moderna em pós-
moderna, que assume o salto do “vertical” para o “horizontal”, da “qualidade”
(formalista) para o “interesse (neo-vanguardista), do “diacrónico” para o
“sincrónico”ou – acrescento eu – da “opticalidade perceptiva” para a “reflexividade
discursiva” não foi na verdade seguida por toda a arte dita pós-moderna. Se a
horizontalidade e, por essa via, a dimensão social e política passaram a caracterizar a
esmagadora maioria das experiências pós-minimalistas, desde a “process art” à
“conceptual art”, da “land art” ao “happening” e à “body art”, entre outros, o certo é
que, por sua vez, a “Pop Art” devolvera a arte, nessa mesma época, a um “contínuo de

23
Idem, p. 282.
24
Idem, p. 199.
25
Id. Ibid.
cultura”26 que não desdenhava, antes pelo contrário, o sistema capitalista de produção
e promoção imagética. Podemos assim identificar duas grandes linhas de acção e
produção artística desde a década de sessenta, a primeira marcada pela consciência da
temporalidade do efémero, do político e da vida não mediada, protagonizada por toda a
tradição pós-minimalista, e a segunda caracterizada pela participação mais ou menos
consciente no grande espectáculo do tardo-capitalismo, não abdicando da essência do
objecto de arte, esse conceito tão criticado pela estratégia pós-minimalista, ainda que
mantenha com esta a mesma determinação pela assunção de uma arte “pós-medium”27.
Na verdade, apesar das virtudes do “modelo textual” aplicado pelo “artista etnógrafo”
em prol da revalorização alternativa do “outro”, Hal Foster defende ainda um outro
conceito essencial para a arte contemporânea que só em parte integra o jargão do
“artista etnógrafo”, o de que hoje “a realidade já não é entendida como efeito de
representação, mas como acontecimento de trauma”28. Com efeito, o registo
traumático de alguma da melhor experiência artística e reflexiva da nossa
contemporaneidade releva fundamentalmente de uma crise de sentido em torno do
sujeito, identificada, pelo menos, desde o segundo pós-guerra. A crise do sujeito é
também uma crise da identidade, do corpo, da autoria e do significado, tal como na tese
essencial de Roland Barthes29. Por isso, o derradeiro esforço de produção de sentido
em torno da experiência artística realiza-se mediante a expressão física e
psicologicamente traumática, seja em imagens infinitamente reproduzidas, como em
Warhol, seja na tomada directa e cruel do corpo, como em Gina Pane, Acconci ou
Chris Burden. Aparentemente, sem efeito ao nível da representação só a imagem do
trauma poderá ainda remeter para o sentido. Todavia, este fenómeno identificado por
Foster em algumas manifestações das neo-vanguardas dos anos 60 e 70 parece ter-se
igualmente convertido, tal como é reconhecido pelo próprio autor, em mais um estágio
dessa neutralização progressiva promovida pelo universo imagético do capitalismo
avançado. Por outro lado, mesmo na apreensão ou percepção efectiva dos fenómenos
que se produzem pela “acção diferida” (conteúdo tomado de Freud por Hal Foster),
isto é, pelo seu efeito de repetição resultante de um reenvio que lhe confirma o lugar na
nossa experiência, é sobretudo ainda o domínio de uma híbrida e distanciada
reprodução de sentido que prevalece e se impõe ao sujeito pós-moderno. Descrente,
confuso e interpretando o real através de uma radical e poderosa acção mediada, o
sujeito contemporâneo, recebe assim uma noção do real que só se realiza
paradoxalmente pela própria ideia de crise da mediação, enquanto registo mais actual
ou contemporâneo sobre a crise do sentido e da identidade que é em última instância da
ordem do ser e da existência. Como nos sugere Jacques Derrida em Structure, sign and
play, “a linguagem invadiu a problemática universal […] na ausência de um centro ou
origem, tudo se transformou em discurso […] isto é, um sistema em que o significado
central, o significado original ou transcendental, nunca está absolutamente presente
fora de um sistema de diferenças. A ausência do significado transcendental expande

26
Cf. Lawrence Alloway, The Long Front of Culture (1959). [citado por Hal Foster, op. cit., p. 282].
27
Sobre a questão da condição pós-medium da arte dos anos 60 e 70 cf. Rosalind Krauss, ‘A Voyage
on the North Sea’ – Art in the Age of the Post-Medium Condition, Londres, Thames & Hudson, 1999.
28
Hal Foster, op. cit., pp. 127-170.
29
Cf. Roland Brathes, A Aventura Semiológica, (1985) (Trad. port.), Lisboa, Edições 70, 1987.
infinitamente o domínio e o jogo da significação”30. Mas também o infinito jogo da
significação tende a tornar-se volúvel e distante. Tal como na perspectiva de Jean
Baudrillard, o capitalismo promove nas sociedades pós-industriais uma última
alienação de sentido e unidade, a do signo e da sua estabilidade significacional,
transformando de modo decisivo o domínio da significação a partir de uma extrema
neutralização do sentido. Esta manifesta-se precisamente na proliferação excessiva e
desenfreada das imagens que nos rodeiam e que se reproduzem de modo autónomo
numa espiral de destituição de todo e qualquer significado mais actuante31. Desse
modo, toda a produção de sentido que a arte activista procura hoje desenvolver e
aprofundar, como nos casos paradigmáticos de Felix Gonzalez-Torres, do Atelier van
Lieshout ou Thomas Hirschhorn, parece resvalar nesta espécie de turbilhão alienador
de disfuncionalidade entrópica que caracteriza o domínio capitalista do Ocidente, bem
como toda a sua toxicidade informativa marcada por uma dispersão e um artificialismo
fundamentalmente desmobilizadores. Isto não significa, porém, que a acção ou o
propósito destas intervenções sejam destituídos de valor. Antes reforçam a tomada de
consciência que estes artistas possuem sobre o alcance bastante residual da sua arte,
desenvolvendo e investindo tudo numa concreta micro-alteração, não panfletária e
situada fundamentalmente ao nível local, sobre a auto-consciência da própria
“comunidade” (a expressão mais contemporânea do “outro”), abdicando assim de
qualquer pretensão imediatista de carácter global ou universalista, atendendo ainda e
sobretudo à necessidade de conciliar, tal como defende Hal Foster para um verdadeiro
alcance do “modelo etnográfico”, a “amplitude discursiva” com a “profundidade
histórica” das representações32, de forma a desenvolver uma verdadeira reflexividade
que projecte finalmente uma mais sólida reconfiguração do(s) sentido(s)33. Esta
espécie de empenho artístico surge assim marcado sobretudo por uma micro-geografia
de activismo que favorece ainda essa outra ideia chave do pensamento mais recente de
Hal Foster, “a closed world that is open to the world”34. Para não comprometer as
suas hipóteses de alteridade, Foster defende que a obra activista deve evitar a “sobre-
identificação com o outro” pois esta “pode alienar mais o outro se não permitir o
‘outrar’ já presente na representação. Face a estes perigos – de demasiada ou de
demasiada pouca distância”, Foster defende ainda “a obra em paralaxe que procura
enquadrar o autor à medida que este vai enquadrando o outro. Esta é uma das formas
de negociar o status contraditório da alteridade enquanto dada e construída, real e
fantasmática”35. Mas, esclarece Hal Foster sobre a orientação que deve nortear o
“artista como etnógrafo”, “uma sobre-identificação redutiva com o outro também não é

30
Jacques Derrida, “Structure, sign and play”, in Writing and difference, trad. Inglesa Alan Bass,
Londres, Routledge, 1978, p. 280. [Citação colhida em Margarida Carvalho, “Híbridos Culturais:
Impurezas e Devires. Análise do conceito de híbrido como representação da alteridade cultural”, in
Tendências da cultura contemporânea. Revista de Comunicação e Linguagens, nº 28, (org. José
Augusto Bragança de Miranda e Eduardo Prado Coelho), Lisboa, Relógio D’Água, Outubro de 2000,
p. 260].
31
Cf. Jean Baudrillard, Para uma crítica da economia política do signo. (1972), (Trad. port), Lisboa,
Ediçoes 70, 1995.
32
Hal Foster, op. cit., p. 202.
33
Idem, pp. 202-203.
34
Cf. Hal Foster, Design and Crime (and other diatribes), Verso Books, London, 2002.
35
Hal Foster, The Return of the Real, p. 203.
desejável. Incomparavelmente pior, no entanto, é uma criminal ausência de
identificação do outro”36.
Ao excesso de imagens produzido pelo omnipresente tardo-capitalismo, a arte política
e activista da nossa contemporaneidade propõe um discurso e uma acção de
envolvimento e participação “do” e “com” o “outro”, fomentando o cruzamento e a
transmissão de responsabilidades que poderão delinear uma acção de cidadania mais
consciente e realizadora. Se esta intenção terá condições para determinar um mais
amplo envolvimento com os vários “públicos” da arte, superando assim a mais
redutora e especular condição de reconhecimento “inter pares” que caracteriza
actualmente o ensimesmamento do meio artístico, é algo que só o futuro poderá, ou
não, vir a confirmar.

36
Id. Ibid.

28 outubro, 2010

THE ART OF POLITICS


HANS HAACKE
Paul Taylor

REPRINT - Flash Art n° 126 - 1986

THE ART OF POLITICS

HANS HAACKE: I never quite understood what my work has to do with Conceptual art, unless this label is applied to all those things that Duchamp associated with the “gray matter,” rather than the retina. In the late ’60s, I became politicized, like a lot of people. As I had been dealing with what I considered, at the time, to be physical and biological ‘systems,’ it appeared to be only logical from the point of view of generalsystems theory, and particularly in view of what was happening in the social arena, also to address social issues. That seemed to require a shift in medium. I felt objects or physical ‘process’ works could not accommodate the involvement with social matters.That led me to the incorporation of words. Our social relations are structured and largely intelligible through verbal constructs. This development in my workcoincided with the influx of words into the art scene of the period.

Paul Taylor: In Hommage à Marcel Broodthaers (1982) a curious image of Ronald Reagan suggests that there is a perverse relationship between the political figure and the masses. Are you implying that politics has become spectacularized?

HH: No, that wasn’t on my mind. Mass demonstrations are not a new phenomenon.

However, politics, as mediated by the press, has indeed become a spectacle. Clever

politicians exploit that. Hitler was a master at it, and so is the actor Ronald Reagan.

PT: Would art play a different role in such a context where even the political seems

unreal?

HH: Let’s not be fooled. Behind the spectacle politics continues, as hard-nosed and real as ever. And if a policy is built on fiction, its results are nevertheless felt in the world of reality. Blacks rebelling in South Africa are shot down with real bullets! They don’t have the luxury to revel in fiction. What is really frightening though is the degree to which fiction is taken for reality at the Reagan White House. Reagan’s ‘Star Wars’ defense concept comes straight from the dream factory. If global policy is developed along the lines of a Hollywood script, we may very well blow up the world. What a spectacle! Reagan as a disciple of Filippo Tommasi Marinetti.

PT: The painting of Ronald Reagan and the one of Margaret Thatcher in Taking Stock

(Unfinished) (1983-84) are ironic. What do you think of the widespread use of irony in art today?

HH: I like it a lot, as long as it isn’t just glib and flirtatious. Irony leaves things in

abeyance and invites the viewer to fill in the gaps. In other words, it is an appeal to the

viewer’s intelligence. I want to have some fun, and so should the audience have. Fun — by using their heads.

PT: People sometimes say that irony is a way of anaesthetizing social injustice and a

form of smug complicity with the status quo.

HH: That depends on which audience you are dealing with.

PT: Again, are we talking about the homeless and the blacks in South Africa or the educated middle class?

HH: Of course irony would be totally out of place in Soweto. My sympathies with the

victims of apartheid should not be mistaken to mean that they are my audience. I wish

though, that they should benefit from my work. People who visit art galleries, museums, and so forth obviously come from a different culture. The same is true for those who learn about what’s in the galleries through the mediation of the press. A good number of them are, in fact, working in the consciousness industry, where opinions are made and promoted. That is the arena where my stuff could perhaps be of use. As I don’t like to be lectured to, so I don’t want to preach with a raised finger. Bertolt Brecht said it quite well, the task is to “make interests interesting.” He was a master of irony.

PT: Why is political art flourishing more than it was ten years ago?

HH: I don’t have a single or conclusive answer. One reason, I’m sure, is the arrival of the Reagan Administration. That served as a reminder that politics didn’t go away, once the Vietnam war was over and the dust of the Watergate scandal had settled. The vacuum left by the political drop-outs was soon filled by the resurgent New Right. In the art world, it ranges from Hilton Kramer to the Saatchi whiz kids. But there is perhaps another reason: among younger artists there seems to be a tremendous sense of alienation. Those who have not joined the yuppies and cynically play the game are thoroughly disgusted with the all pervasive marketing mentality of the contemporary artscene. As a result, they get politicized. The ideological polarization in this country has given such attitudes new legitimacy. They don’t look ridiculous anymore. The Me generation seems to be on its way out, as the nostalgia for the ’50s is fading. You may even look at it in marketing terms. The art world, like the world at large, has been so saturated by the products of a phony individualism and coy rebellion that for no better reason than out of boredom the audience wants something different. Let me add, the type of art I just alluded to with contempt has had as much an ideological and, by implication, a political effect, as socalled political art does. It is naïve toassume that artworks made without a political intent lack a political dimension. This is something Marcel Broodthaers knew very well.

Taking Stock (Unfinished), 1983-84. Oil on canvas and gilded wood frame, 241 x 206 x 18 cm.

PT: Then there are others, like Sue Coe, who think they are making political art by doingexpressionistic illustrations of social injustice. Is that kind of artist a political artist in your book?

HH: Like a number of other artists Sue Coe makes political testimonials. She uses

exhortation, and she appeals to the viewer’s compassion for the victims of injustice, a bit like Käthe Kollwitz and artists of that generation.

PT: It is denotatively political.

HH: I believe the means with which I work are as political as the subject matter, that is

to say, they play an equally signifying and interventionist role.

PT: If, indeed, such things can be equivalent. Are the media you use — painting, photo-text, sculpture — totally instrumental to your purposes?

HH: I don’t engage in formal exploration for its own sake. I choose the medium that

appears to be most useful for a particular occasion or purpose — and on the way I

discover things. It is really more explorative and playful than it sounds.

PT: Could you, in the case of Taking Stock (Unfinished), have used photography and

collage?

HH: No, because photography doesn’t have the aura of painting.

PT: So it is not regressive to appeal to painting’s auratic status these days?

HH: If you were to embrace the aura, I would be wary. I don’t believe in halo painting. I use the aura ironically. It glows within quotation marks, like the gold frames around my portrait paintings.

PT: You once commented to me that magazines like Manhattan Inc., which have

a corporate culture section, are doing what you’ve done over the years, that is, linking

the interests of corporations with what we see as culture. Why are such critiques

becoming widespread?

HH: The de facto mergers of the Whitney Museum with various companies, the remodeling of the Chase Manhattan Bank’s Soho branch into an art gallery, and particularly the way art is strategically employed to attract tenants for the new Equitable Life Insurance Building in NewYork, all these events seem to have served as signals that something is afoot. Also the letter of Philip Morris sent to museums who had been recipients of the company’s ‘largess,’ buttonholing them to lobby against pending restrictions on smoking in public places, did not sit well with a lot of people. Nor did the Metropolitan Museum gain in scholarly reputation by mounting a show with the sublime title “Man and the Horse” to promote Ralph Lauren. But these are only the more spectacular and silly aspects of the corporate invasion of the art world. They make flashy copy.While more fundamental problems are not ignored, they are often balanced against the argument that art was always supported by special interest groups like the church, the princes, etc., and that it would be unreasonable to expect that corporations don’t want something in return for their money. This argument is often made in terms that reveal a tacit admiration for the cynicism of the scheme, not unlike the fascination with the entrepreneurial spirit of certain artists. I believeone doesn’t realize what price we have paid for inviting business to take over.

Homage to Marcel Broodthears, 1982-83. Installation view.

PT: With the return of painting in the socalled advanced art scene, has the concept

of art been commodified?

HH: Artworks have always played a multiple role; one of them is that of a commodity. Paintings lend themselves better to performing this function than many of the things that came on the scene in the late ’60s and early ’70s. Much of that was burdened with the additional mortgage ofbeing rather austere and dry. It is therefore not surprising that there was a backlash. One wanted to see colors again, something sensuous, have some fun, and believe again in geniuses and castles. No doubt, there are many other reasons for the ‘hunger for painting.’ The most remarkable phenomenon is, however, that the astuteness of an artist in developing a marketing strategy, to ‘position’ himself — they are mostly males — is valued as an artistic accomplishment in its own right.

PT: Speaking as one who wasn’t around in that era, I have nevertheless thought that the feelings about non-object art ran deeper than that. I thought people believed art had really changed. The concept of art was meant to have been freed from the commodity and to be more ethereallyartistic. Is that how artists felt?

HH: Yes, there was a heady sense that making art had nothing to do with making money. Of course, one still had to pay the rent. As always there were people with big egos, but fame was not measured in terms of sales. I am not the only one who feels the clock has been turned back.

PT: Is the idea of historical progress being discarded?

HH: This gets very philosophical. It may sound pretty trivial and also pompous: I would like to believe in a utopia, a more humane society, at peace with the environment. But I confess I’m not very confident. We are getting drained already by the struggle not to let things slip further into barbarism.

PT: Would a revival of Conceptual art be ironic?

HH: Rather than truly ironic it would be sad, like all revivals.

Paul Taylor was a regular contributor to Flash Art. He founded the magazine Art & Text and worked as a freelance journalist writing on the art scene for The New York Times, Vanity Fair,New York, and The Village Voice, among others.

He died in Melbourne in 1992.

Hans Haacke was born 1936 in Cologne, Germany. He lives and works in New York.